quarta-feira, 24 de outubro de 2012


“Adolescer é coisa tão complicada que a própria palavra vem de doer, de adoecer. Exagero dos romanos, que criaram no seu latim a palavra adolescentia com essa ambiguidade? Nem tanto. Toda a literatura sobre o tema (que só nos últimos 50 anos deve pesar toneladas) converge em certas questões, destacadas pela psicologia, pela sociologia e por todas as outras ciências que estudam o comportamento humano.
Questões sobre a transição, a aventura de cada descoberta, o desabrochar da sexualidade, as mudanças corporais e o imenso salto intelectual com o acúmulo de informações sobre o mundo que marcam essa etapa.
Mas questões sobre as responsabilidades crescentes e a luta pela autonomia, os conflitos domésticos e entre gerações, os conflitos com o outro e consigo mesmo.
E isso não é tudo: a inserção nas regras do jogo do mundo adulto (a a  inevitável contestação a essas regras) vem acompanhada pela perda das facilidades da infância e a perplexidade diante da vida que se entreabre, com suas promessas de delícias e ameaças.
Daí a chamada crise da adolescência, cheia de inseguranças e de espinhas na cara.
Por tudo isso, os adolescentes costumam se sentir incompreendidos pelos mais velhos (na maioria, diga-se de passagem, com toda razão) e adotam comportamentos e códigos próprios, desviantes dos padrões esperados, mas completamente legítimos no interior da “turma”, onde cada passo é compartilhado e a confiança é incondicional.
O adolescente é um bicho ético, que detesta a hipocrisia: está procurando, em cada experiência nova, um fundamento da arte de viver. Para isso, a verdade é essencial. Cada experiência é decisiva porque ele sabe que em cada escolha está se construindo como pessoa. Tudo tem que ser falado, dissecado, trocado em miúdos.
Afinal, a vida é uma festa, mas uma festa cheia de mistérios.”


(MARIANA, Maria. Confissões de adolescente. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1992. 96 p.)
Desenho, disponível em: http://www.correio24horas.com.br/blogs/bazar-e-cia/?tag=desenho

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